segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Comprei alhos há 9 meses

A experiência mais primordial que tive com alhos foi na faculdade quando um magricelas praxista de óculos vedados pela espessura das lentes, acne resquicial de uma adolescência celibatária e cabelo a condizer (masturbava-se por debaixo do fato de treino de costas para a porta com essencialmente pornografia e imagens da mãe do seu melhor amigo a fazer-lhe um broche), o mesmo é dizer reluzente e caspudo, como o meu, tenta obrigar-me a comer um dente de alho, inteiro, apenas por ser desagradável. Depois de lhe perguntar se foi assim que ele tinha conquistado a sua namorada (que estava lá ao lado, de pele amarelada pela chatice e filtros de cigarro armados em bonnie&clyde académicos), o rapaz assegurou-me de que afinal teria de comer dois dentes ao invés de um apenas, o castigo inicial. Perguntei-lhe (faço-me de parvo) porquê respondeu-me que era assim mesmo (a rapariga ria-se nervosamente, numa ausência de queixo intrigante). Perante a maçada de ter de os aturar, mastiguei aquelas pérolas baças e engoli (fiz também umas referências a buñuel). Nem é assim tão mau, comentei, e em silêncio mandei-o para a puta que o pariu. Soube mais tarde que o pobre diabo, já licenciado, fora trabalhar para o extremo do país para o pai da noiva amarelada mas que entretanto ela se tinha entregue às delícias doutras genitálias mais bronzeadas, o que criou um grande embaraço a toda a família e angústia profunda ao meu castigador.
Apercebi-me, ao longo da vida, que noutros sítios também abusam do alho. Por exemplo, o aclamado bife à cortador não passa duma bodeguice; já o bife à príncipe (do calhariz) sabe bem, mas é por ser grande como o caralho.
Mais tarde estava eu a comprá-los, numa loja que os vendia. Perguntei a uma funcionária de olhos tristes mãos inchadas quais eram os melhores e a sua roupa manchada deu-me a entender que me fosse tratar, mas proferiu (triste, sempre tristemente) que ela gostava de alhos grandes, por darem menos trabalho. Pensei que o pensamento prático da gente era inestimável e que já era altura de eu próprio adquirir um. O prazo de validade de um alho torna-se pois relevante na medida em que uma pessoa a viver sozinha (obviamente que eu preferia estar a foder do que a escrever este blog) não cozinha assim tanto quanto isso, embora até me dê gozo (do ponto de vista puramente químico) essa actividade e os alhos que se vendem são em quantidades familiares chegando a ter centenas de dentes.
A experiência que encetei foi muito simples: comprei 2 enchumaços de alhos e individualizei os dentes todos (176) de um deles, deixando os do outro pacote agrupados em cabeças que de vez em quando rachava para extrair um molar jeitoso. Os pratos que geralmente faço com alho são todos os pratos que faço excepto as sopas e tartes.
A conclusão deste estudo duplamente mudo é que aqueles que se mantêm dentro do frágil prepúcio duram mais tempo e os individualizados ficam com mau aspecto com relativa rapidez. Mas quanto tempo dura um alho então? Potencialmente para sempre, parece-me.

2 comentários:

Supertatas disse...

poderás conservá-los, já individualizados, em azeite dentro do frigorifico, com a vantagem de até serem de mais rapida utilização. um ou outro canino na sopa tb sabe muito bem.

Cisto disse...

São comentários desse género que aprecio!