domingo, 16 de novembro de 2008

Soho

Encontrámos um casal conhecido num bar do Soho do qual pouco mais sabíamos para além das nacionalidades - albanesa e americana. Um casal improvável, talvez, e ele rapava os pêlos do peito. Mas encontramo-los num bar do Soho e fomos convidados para uma festa especial, disse o cabrão do albanês, dando-me uma pancada nas costas como se tivessemos andado na guerra juntos e eu pensei cabrão do caraças era bom era que... enfim..., ela aproximava muito a cara da minha, dando-me a sensação de que se estava sempre a despedir com dois beijinhos e uma das vezes cheguei a beijá-la de lado, o que deve ter sido insólito, tendo em conta que me pediu lume.
Conduzidos então pelo albanês pelas ruas do Soho (o mesmo é dizer homens vestidos de mulher; homens a vomitar pendurados nos sinais de trânsito; mulheres sentadas na berma iluminadas por uns faróis de carro preocupados; táxis-triciclo à moda oriental conduzidos por polacos; etc) dirigíamo-nos ao destino incerto, à festa especial, para a qual, depois de uma pausa no seu discurso que sugeriu reflexão, o albanês nos disse
vocês não pagam, ok?
ziguezagueava ele de costas quadradas e rabo de cavalo digno de 1992 e eu tonto de me desviar da ave de rapina daquela cara americana de voz grossa mas agradável. É aqui, disse o gajo, e eu pensei que ele se tivesse a referir ao bar que tinha uma fila de 30 pessoas, mas era a porta ao lado, a porta de madeira molhada pintada de azul que me fazia lembrar elephant and castle e as suas barracas.
Lá dentro fui informaram-me de que o espaço era dum primo de alguém (ah sim?), ofereceram-nos bebidas, eu escolhi cerveja, e um gordo caspudo surgiu
a vossa cabine fica livre em 2 minutos
e 2 minutos mais tarde concluí que ía ser encarcerado com aqueles dois numa cabine de karaoke.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

espargos ou senti nostalgia naquela manhã

O que mais me agradava nos meus passeios por lisboa era encontrar ruas novas para mim de cada vez que a percorria, novos edifícios, calçadas encarquilhadas, degraus vesgos vergados de solas. Acontecia-me com frequência encontrar, ao lado de ruas bastante famosas da minha percepção, outras desconhecidas, nunca as tinha visto e elas ali misteriosamente há uns duzentos anos, e as pessoas que as habitam, em silêncio de brisa, na escuridão das portas pequenas, vizinhas das outras maiores acorrentadas em ferrugem, degraus húmidos, folhas mortas. Uma estaca de metal que sublinhava a corrente do portão de um palacete na rua do teixeira era percorrida - se espreitássemos por entre as frinchas do ferro - por insectos pedestres que a tomaram como árvore, por exemplo.
Dou por mim emocionado na varanda de são pedro de alcântara perante o amplo esplendor desta cidade. Tento identificar as zonas: penha de frança, torel, lavra, graça, o castelo, mas ao esticar o pescoço mais à frente, sobre a minha direita, assusto-me com o reflexo do sol no tejo, (maldito rio de sol, terei dito) a sé em contra-luz e humedeceram-se-me os olhos, não sei se do inesperado brilho se doutra coisa qualquer (lembro-me de tudo com um certo pudor) enquanto turistas filmavam o ascensor da glória. Eu só conseguia pensar em como este rio nos persegue em cada esquina dobrada, todo o peso de uma nação que por ele corre, testemunha de um povo lamuriento. O rio ao longe como a morte que nos espreita, é isso que queria dizer. Tal como o cristo-redentor afaga os cariocas de cada vez que erguem o olhar, o tejo ancora-nos a alma de cada vez que o baixamos, o que me levanta dúvidas acerca de o poder abandonar por muito tempo.
Nesse dia não aproveitei os espargos verdes que tinha armazenado no frigorífico, na verdade não aguentam muito tempo sem serem cozinhados. Mas eis como o fiz em dias claros:
-parti o caule no sítio onde deve ser partido e para isso bastou dobrá-los até ao insuportável;
-aqueci azeite com sementes de piri-piri e, quando me lembrei, atirei os espargos;
-salpiquei com sal em movimentos indecisos;
-o lume encontrava-se baixo e esperei uns 8 minutos (e virando os espargos, memorizei rachas);
-servi com uns bofes de vinagre balsâmico e queijo parmesão em lascas.

Avaliei o resultado e concordei com o Dostoievski quando disse que o normal é apenas uma palavra que corresponde à incapacidade de observar a incontornável nuance.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

a propósito de lojas de chineses

lisboa é uma rua deserta de gente com um carro funerário encostado de mandíbulas de bagageira escancaradas sob o sol do meio dia, e o azul porcelana de um céu sem brilho interrogando candeeiros que por esquecimento ou falha técnica permanecem ligados, pensava eu a caminho de uma miragem de mercado impossível em dia de feriado municipal, determinado a não pagar 2 euros por um saco de três quilos de batatas francesas, clarinhas e limpinhas ao ponto de se lhas apetecer lamber,
lisboa é o senhor de camisa azul porcelana baça com manchas circulares de humidade de epicentro de sovaco enfiada por dentro das calças cinzentas, as mangas arregaçadas descobrindo braços morenos que arrastam o carvalho de caixão para os fundos do carro funerário em fulgor de rins, pensava tal como pensava nas batatas que me alimentaria a sopa, dois ou três espécimens, não quero sacos de três quilos, murmurava, já, sem saber se o murmúrio seria audível às ilhas de 
tristes árvores de passeio. para mim uma sopa pode levar:

-3 batatas, sem casca (pois não a querem mais tarde alojada entre incisivos a fazer as vezes de papilas de gengiva nicotínicas) de tamanho médio (o mesmo é dizer que o tamanho é indiferente, neste caso, a não ser que sejam esquisitos)
-uma cebola pequena (como alternativa prática, cortar uma cebola ao meio)
- alho francês (por uma questão lúdica, eliminem as folhas superficiais, tesas e de verde intenso quase azul, e contentem-se apenas com as virgens e tenras do interior. este conselho é aplicável a outros aspectos da vida)
- umas 350g de cogumelos (esfregá-los com propósitos higiénicos cria sempre a tentação repulsiva de os trincar crus, bem sei, o sabor de madeira fúngica a desfazer-se em troncos de húmus no interior das bochechas tornando a saliva numa espécie de margem espumosa de barragem hidroeléctrica)
- uma cenoura (mais que isso e terão como resultado um creme juvenil de levar para a praia)
- azeite
- pimenta branca
- 4 dentes de alho (ou menos, dependendo do tempo que decorreu desde a vossa última visita ao Príncipe do Calhariz)
tudo passadinho mas com rigor de ministro da economia, ou, noutras palavras, saber-vos-á bem alguma textura de sopa a escamar pelo dorso da língua

dizia eu que partia em busca de batatas que não fossem de três quilos a saca pois a questão é que vivendo sozinho teme-se pelo crescimento do grelo. o grelo em inglês diz-se
sprout, se estiverem interessado. diz-se que pelo grelo se pode avaliar a ausência de frescura do tubérculo tal como pelas neoplasias espalhadas pelas mãos e braços se se revele a senilidade dos jogadores de cartas da alameda afonso henriques, fugitivos das casas de repouso circundantes. o grelo cresce por vezes por entre os buracos de rede dos sacos das batatas em âncoras de unhas de gato no parapeito quando estes se recusam a serem atirados janela abaixo. numa palavra: tumores repugnantes mas que suscitam curiosidade, sem dúvida.
ao contemplar um saco de batatas de origem francesa no minipreço imaginei magníficas estufas maquinadas por máquinas em vez de mãos de carne de terra nas unhas tomei-lhe o cheiro insípido das cadeias de moléculas inorgânicas do plástico mas sobretudo imaginei os tentáculos felpudos de grelo a emergirem da superfície de batata como para o indivíduo desprevenido os blocos de prédios suburbanos surgem de um dia para o outro na paisagem rural.
desci do largo do mitelo para o desterro atravessando agências funerárias prometedoras de descanso eterno tubercular e lembrei-me de que um molho de cebolinho também não ficaria mal na sopa. um prédio de vidros partidos e garrafas de cerveja aos bocados e poças de urina em remendos de alcatrão levaram-me ao intendente e à avenida almirante reis com as suas pensões de linóleo mal colado e sujo onde uma vez por curiosidade de grelo entrei e, fingi-me estrangeiro, caminhei por dez minutos protegendo-me em arestas de sombras do sol vertical de lisboa ao meio dia em feriado municipal. no meio de portas de alumínio, de janelas de alumínio de cabos de televisão meio soltos nas paredes e telhados de onde pendem cobertores ensopados ainda do inverno fantasmas de pessoas desterradas reunidas em lojas de telefones onde as chamadas internacionais são mais baratas vagueavam. atravessei tudo isso e até os búzios do ramiro que engoli de mãos inchadas pelo azoto líquido do hospital do desterro com que o meu pai me tirou os cravos das mãos e cheguei à única frutaria aberta em lisboa em dia de feriado municipal: é de chineses e só tem produtos nacionais, as batatas vêm com terra e os tomates cheiram a chuva.
mas lisboa não é isso.

domingo, 13 de abril de 2008

coxa de colegial abraçada em poejo

Talvez tenha sido por a caminho do supermercado ter apanhado um fragmento de um diálogo entre um casal que discutia uma vasectomia,
sabes, quando cortam as.. os canais e já não dá p'ra-
sim sim sim sim sim sei
ou
talvez uma velha de lábio superior seco arreganhado, os dentes com uns 15 cm de comprimento; as gengivas hemorrágicas, que não se despachava na caixa, segurava uma bengala e a carteira, sem mãos para todo o resto abraçada por um casaco de malha em tudo semelhante à cabeleira cheia de borboto e migalhas terá dito com alguma violência que não queria moedas pretas ou
a rapariga da caixa, ruiva e tímida mas que me olhava muito directamente, raríssimo hoje em dia em Lisboa, a imagem do que a velha teria sido há 130 anos atrás ainda Lisboa era assim, ruiva e tímida de olhos grandes e o cheiro a mijo perto do largo do Mitelo bastante mais intenso, perguntou-me se queria sacos, pareceu-me que passou com a língua pelos lábios muito rapidamente, que imagem fornecerei eu?, que sou eu?, qual o meu volume naquele espaço?, a minha barba e o meu chapéu o que são ali?
não sei se foi tudo isso mas lembro-me de ter comprado aquele naco de colegial barrosã como se fosse hoje e no entanto o rótulo afirmava Outubro 2007. É certo que o congelei bem congelado, imaculadamente poderia dizer, não fossem as cervejas que lá rebentaram por diversas vezes devido ao prazer incompreensível de alguns amigos as quererem assim, mas seis meses não será demais para ainda estar bom, esse naco?
Tenho sempre imensas dúvidas a nível de conservação mas não quer dizer que hesite na hora de cozinhar, tal como os ovos que comi podres, por causa da fome. Cozinhei então da seguinte forma:

- ensaquei o naco com sal e vinagre balsâmico e durante meia hora assim permaneceu
- besuntei-o voluptuosamente com banha de porco (não se armem em esquisitos) e azeite
- juntei pimenta branca como que não quer a coisa e poejo em quantidades inacreditáveis
- o forno estava a 220º e assim ficou durante 45 minutos; despejei o que ficara no saco
- fiz também um arroz de tomate com tomates apanhados no Campo dos Mártires da Pátria, que são propositadamente pouco sumarentos e juntei poejo para que não se estragasse

Tudo se me apresentou delicioso e concluí que vitela no congelador deixa de ter prazo de validade e pensando bem eu também não estou tão diferente assim do que estava em Outubro.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

as efémeras delícias

Tenho fotografias dependuradas das paredes colei-as com fita cola cuidadosa no verso num dia em que me apeteceu fazê-lo, são de tempos longíquos e recentes ao mesmo tempo. Tenho um tapete persa e um outro do Ikea mas geralmente os amigos tendem a despejar o whiskey no primeiro. Tenho uma tarte de ovo daquelas alentejanas fabricadas no carregado em cima de uma mesa há 6 dias e pergunto-lhe da saúde - parece-me estar esborrachada de humidade que tenho um telhado antigo e tem chovido bastante e a tarte ali, amarela, ao centro da mesa (tem uma forma de alumínio que me lembra certas secções do Pingo Doce). Comprei um pão há três semanas que jaz na bancada da cozinha (o pão fica verde com o tempo) mas que por sentimento de culpa e alguns escrúpulos não o arremessei ainda pela janela. Já os bróculos do frigorífico ficam amarelos se não comidos num prazo inferior a trinta dias. Tive a certeza de que preferia bróculos salteado aos simples num serão de Fevereiro aquecido por ar-condicionado em que cozinhei arroz e ficou uma merda e houve ou havia outra pessoa que pretendeu fritar um bife no microondas, numa magnificação da utilidade deste. Por amor, adorei. Resfatelei-me depois indisposto nas costas da cadeira de faia olhei para a porta também de faia incólume de tempo, pareceu-me ver por ali uma estátua minúscula de um anjo rachado pregado ao peladur, pensei em beber um café que me acamasse a agonia e imaginei-me a tirar-lhe as cuecas puxando-as pelos lados com alguma dificuldade em ultrapassar a carne da anca.

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

A ausência do tempo

A delicadeza das questões que tenho levantado - ainda não foram muitas pois dou por mim a chegar a casa e a olhar para o branco brilhante atenuado do ecran olhar para as teclas premir algumas chegar-me para trás enrolar um cigarro (hábito recente, que surgiu ao mesmo tempo do mictar sentado, que não me traz orgulho mas sim ausência de pingas de mijo por todo o lado) e acabar por ir de dez em dez minutos verificar se a roupa já está seca mas parece-me sempre que ao invés apodrece numa humidade fria e empapada - poderá tornar-se absurda face à tecnologia de armazenamento a vácuo dos alimentos, segundo uma amiga minha.
Existem soluções deste género e não é só na tv-shop (o que será feito desta pérfida maneira de vender inutilidades disfarçadas de soluções revolucionárias para os problemas práticos da humanidade depois do desenvolvimento pujante da internet?) que as encontramos. É hoje possível armazenar um peito de pato acamado em beliche de queijo de cabra e ervas da beira baixa e comê-lo três semanas depois com a mesma frescura e a verdade é só essa. Isolamos o elemento tempo das coisas sem lhes tirarmos qualidades como um antigo flirt que conservamos no msn para o caso de se sentir fome.
E isto à custa de lhes tirarmos o ar, de os sufocarmos num canto asséptico (o tanas!) - sou só eu ou há mesmo algo de muito perverso em toda esta tentativa? Queremos mesmo fazer uma refeição com uma beringela que comprámos em 2003?

Bem, se estiver boa, talvez.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Comprei alhos há 9 meses

A experiência mais primordial que tive com alhos foi na faculdade quando um magricelas praxista de óculos vedados pela espessura das lentes, acne resquicial de uma adolescência celibatária e cabelo a condizer (masturbava-se por debaixo do fato de treino de costas para a porta com essencialmente pornografia e imagens da mãe do seu melhor amigo a fazer-lhe um broche), o mesmo é dizer reluzente e caspudo, como o meu, tenta obrigar-me a comer um dente de alho, inteiro, apenas por ser desagradável. Depois de lhe perguntar se foi assim que ele tinha conquistado a sua namorada (que estava lá ao lado, de pele amarelada pela chatice e filtros de cigarro armados em bonnie&clyde académicos), o rapaz assegurou-me de que afinal teria de comer dois dentes ao invés de um apenas, o castigo inicial. Perguntei-lhe (faço-me de parvo) porquê respondeu-me que era assim mesmo (a rapariga ria-se nervosamente, numa ausência de queixo intrigante). Perante a maçada de ter de os aturar, mastiguei aquelas pérolas baças e engoli (fiz também umas referências a buñuel). Nem é assim tão mau, comentei, e em silêncio mandei-o para a puta que o pariu. Soube mais tarde que o pobre diabo, já licenciado, fora trabalhar para o extremo do país para o pai da noiva amarelada mas que entretanto ela se tinha entregue às delícias doutras genitálias mais bronzeadas, o que criou um grande embaraço a toda a família e angústia profunda ao meu castigador.
Apercebi-me, ao longo da vida, que noutros sítios também abusam do alho. Por exemplo, o aclamado bife à cortador não passa duma bodeguice; já o bife à príncipe (do calhariz) sabe bem, mas é por ser grande como o caralho.
Mais tarde estava eu a comprá-los, numa loja que os vendia. Perguntei a uma funcionária de olhos tristes mãos inchadas quais eram os melhores e a sua roupa manchada deu-me a entender que me fosse tratar, mas proferiu (triste, sempre tristemente) que ela gostava de alhos grandes, por darem menos trabalho. Pensei que o pensamento prático da gente era inestimável e que já era altura de eu próprio adquirir um. O prazo de validade de um alho torna-se pois relevante na medida em que uma pessoa a viver sozinha (obviamente que eu preferia estar a foder do que a escrever este blog) não cozinha assim tanto quanto isso, embora até me dê gozo (do ponto de vista puramente químico) essa actividade e os alhos que se vendem são em quantidades familiares chegando a ter centenas de dentes.
A experiência que encetei foi muito simples: comprei 2 enchumaços de alhos e individualizei os dentes todos (176) de um deles, deixando os do outro pacote agrupados em cabeças que de vez em quando rachava para extrair um molar jeitoso. Os pratos que geralmente faço com alho são todos os pratos que faço excepto as sopas e tartes.
A conclusão deste estudo duplamente mudo é que aqueles que se mantêm dentro do frágil prepúcio duram mais tempo e os individualizados ficam com mau aspecto com relativa rapidez. Mas quanto tempo dura um alho então? Potencialmente para sempre, parece-me.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

A redundância do ovo

Desde os tempos em que mastigava as carcaças com ovo mexido enroladas num alumínio que levava para a praia, com alface, em que prensava o pão da carcaça borrachóide com os incisivos mal alinhados num acto sem grande prazer mas a minha mãe dizia que a proteína do ovo far-me-ia bem aos olhos e de facto só tenho 3 dioptrias de miopia, as prudentes indicações, Não deixes a sandes ao sol, ou , Come isso até 4ª feira,
desde esses tempos primordiais, dizia eu, que tenho respeito pelos ovos e gemadas (as claras em castelo, essas, aparentam ser sempre poéticas e inofensivas).
Vivemos de facto na sombra de determinados receios, o mais das vezes mal estudados. Como uma avó que não liga a televisão por ter medo que se estrague e passa uma velhice confrontada, de olhos de catarata, com o negro do ecran convexo.

Quanto tempo, afinal, duram os ovos e qual o melhor método de os conservar sãos?

Há vários métodos de avaliar a duração de um ovo, uns mais científicos que outros - o que me levanta dúvidas acerca da validade do viver cegamente através da ciência, isto é, sem espaço para a subjectividade, para a não-análise, enfim, o corporal não tortuoso - que são:
1) observar a data de validade da caixa dos ovos, caso se tenha conservado a mesma, por alguma razão de loucura metódica;
2) ao partir a casca do ovo, certificar-se de que a gema sai redonda, incólume, qual teta de silicone. Este método causa dificuldades acrescidas a quem tem unhas grandes, pois pode-se lesionar a gema durante o acto de rotura da casca, o que leva a confusões semânticas;
3) se o objectivo for cozer o ovo, dever-se-á avaliar se o mesmo boia durante a fervura ou se permanece afundado. Se se tratar de um ovo idoso, à partida apresentará gases no seu interior (butano e bufano, essencialmente) e então boiará (o mesmo se verifica nas pessoas se por acaso as mandasseis para o Tejo) . O melhor a fazer nessas situações, independentemente do dia da semana a que nos encontremos, é: não ingerir o ovo.

Porém, caso a fome seja negra, diria que até 3 meses após do final do prazo anunciado, o ovo é comestível. Nesse caso, no entanto, sugiro a utilização de um protector gástrico.

Como conservação, pelo sim pelo não, metam-nos no frigorífico. Para aqueles que carecem de espaço refrigerado, não os metam no frigorífico, é-me indiferente.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Mote

Este blog nasceu da minha experiência pessoal em viver sozinho. Se dantes a minha cabeça andava ocupada apenas com deambulações filosóficas acerca sobretudo do significado que a existência humana poderia ter, de repente tornou-se obcecada com detalhes do género "será que esta cebola ainda está boa?".
É certo que o passar dos meses aliviou este tormento mundano, porém por outro lado criou-se-me a necessidade de registar diversos prazos de validade das coisas para não cometer o mesmo erro duas vezes.
Partilho pois agora a valiosa informação que fui recolhendo ao longo do áspero tempo em que tenho vivido sozinho em Lisboa (e sugiro que façam o mesmo, enviando-me por email as vossas experiências).

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